quarta-feira, 26 de junho de 2013

AFTER DARK - OS PASSAGEIROS DA NOITE

Neste romance, Murakami convida os leitores a serem observadores de uma noite em Tóquio, em que uma espécie de câmara de filmar imaginária segue  os passos de três personagens - Mari, Takahashi e Shirakawa - enquanto, de tempos a tempos, se debruça sobre a cama onde Eri, a irmã de Mari, dorme profundamente. Ou será que está presa nalgum sonho ou pesadelo?

"Aproxima-se a meia-noite, o ponto alto da sua actividade já passou, mas o metabolismo vital que assegura a vida continua a trabalhar incessantemente, produzindo o 'basso' contínuo que reproduz os murmúrios da cidade, um som monótono, sem altos nem baixos, se bem que prenhe de pressentimentos", escreve o autor logo na primeira das 224 páginas. Assim, vão-se sucedendo vários encontros entre Mari e Takahashi, que se conheceram vagamente poucos anos atrás, ambos estudantes mas que não parecem ter muito em comum para além da solidão, ou talvez também a insegurança da juventude. 

Mas na noite citadina cruzam-se outras personagens, como a gerente de um hotel de amor que precisa de ajuda para entender o que aconteceu à prostituta ilegal chinesa que foi espancada e roubada por um cliente, o funcionário sobrecarregado de serviço que perpetrou o crime, o mal encarado motoqueiro que transporta as prostitutas para os serviços ou a empregada de limpeza que foge do seu passado. É uma noite como tantas outras, onde só temos um breve relance da realidade de cada uma dessas vidas, que escondem os seus dramas, angústias, tristezas e incertezas. Embora aparentemente pacífica e sem sobressaltos, como o sono pesado de Eri, esse povoado de fantasmas que apenas se adivinham...

Tal como a Manuel Cardoso - para quem não sabe, vou sempre espreitar se ele já leu o livro e a apreciação que fez - a lenda dos três irmãos que foram ao mar para pescar, mas apanharam uma tempestade e foram parar a uma ilha deserta com uma enorme montanha, referida logo no início, parece-me ser um dos motes do enredo. E em vez de citações, resumo o resto da lenda: Quando chegaram à ilha, um deus apareceu-lhes em sonhos e disse que iriam encontrar três grandes rochedos redondos, que cada um rolaria até onde lhe aprouvesse, e no sítio onde escolhessem parar ali ficariam a viver. "Quanto mais alto subir, tanto mais vasta será a vossa visão do mundo." Mas os rochedos eram grandes e pesados, e depressa o irmão mais novo desistiu da tarefa e ficou junto à praia, onde teria peixe para pescar, desistindo de ver o mundo. Os outros dois continuaram a árdua tarefa de rodar os pedregulhos, mas a meio da encosta o segundo desistiu,  pois teria frutos em abundância para sobreviver, não se importando de não ver grande coisa do mundo. O mais velho continuou a ascensão, embora em condições cada vez piores, mas não desistiu, empurrou o rochedo durante meses até chegar ao alto da montanha. As plantas e animais escasseavam, a alimentação era difícil, a água era a do gelo, "mas não estava arrependido, pois conseguia avistar o mundo inteiro". A lenda também serve de explicação para existir um enorme rochedo num cume de uma montanha numa ilha havaiana. 

É sempre um prazer ler Murakami, mesmo que tenha preferido outros livros do grande escritor japonês, que já há alguns anos é um sério candidato ao Nobel da Literatura. Será que o facto de ter grande sucesso de vendas a nível mundial impede a Academia sueca de lhe entregar o galardão? 

8 comentários:

  1. Talvez deva debruçar-me um pouco mais sobre as obras deste escritor.

    Estou a aguardar que a biblioteca me disponibilize dois livros de autores que, creio, nunca li e que me foram sugeridos por duas colegas de trabalho:

    “My Ántonia” de Willa Cather e

    “Un Mundo para Julius” de Alfredo Bryce Echenique, escritor peruano.

    Já leste alguns livros destes escritores?

    Há quase dois meses que estou à espera deles. São livros muito requisitados. Continuo na lista de espera.

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    1. Não conheço nenhum deles, CATARINA, mas já reparei que aqui são mais evidenciados escritores diferentes do que aí. Se bem que aos poucos eles vão aparecendo... :)

      De Murakami gosto muito, sendo que só recentemente o comecei a ler - em 2008, para ser mais precisa! ;)

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  2. Mais uma sugestão para juntar a algumas que já por aqui tenho.
    Por agora, estou a finalizar "O Amor em Tempos de Cólera"

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    1. Nunca li, mas tenho-o na minha estante, PEDRO! :)

      Isto de arrumar e limpar estantes antes de férias dá o seu jeito, que vamos anotando uns quantos livros que podemos levar na bagagem... ;)

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  3. E eu ainda não comprei os outros três...

    Ando numa fase de não ler, tenho imensos em fila de espera e a reclamar atenção...acho que tenho que ir de férias mais cedo este ano :p

    Fica a sugestão.

    Beijinho :)

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    1. Bom, é raro, mas de vez em quando também tenho fases dessas, MARIA! :)

      Beijocas!

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  4. Conheço o livro mas, tal como outros, não o consegui ler todo. Mas percebi perfeitamente a dualidade entre a realidade e o sonho, tão característico neste autor.

    Beijocas

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    1. Só não acabo de ler os livros que me desagradam, que não percebo, ou que por alguma razão perco o fio à meada, JP! Não gosto de deixar livros a meio, mas de vez em quando lá acontece... :)

      Beijocas!

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Sorri! Estás a ser filmad@ e lid@ atentamente... :)